sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Lélia Abramo




(São Paulo em 08/02/1911 - São Paulo em 08/04/2004).

Lélia Abramo é filha de imigrantes italianos, e trouxe da origem familiar a aptidão pelas lutas políticas. A atriz foi criada num casarão no bairro do Ipiranga, em São Paulo, com sete irmãos. O pai Vicenzo Abramo era empresário da área têxtil. Tinha sido sócio do conde Francisco Matarazzo em uma fábrica de tecidos no final da primeira década do século, até naufragar pouco tempo depois. Vicenzo morreu em 1949, sem ver a filha que estava na Itália. A casa sempre foi reduto de encontros entre jornalistas, escritores, artistas e políticos da esquerda brasileira. O caçula Cláudio notabilizou-se como um dos maiores jornalistas da história do Brasil. Já Lélia era fascinada pela ribalta.


Junto com seus irmãos, o artista plástico Lívio Abramo, Beatriz Abramo, os jornalistas Athos Abramo, Fúlvio Abramo e Cláudio Abramo, faz parte de uma família que teve grande presença na história brasileira, tanto na militância política como na arte. Lélia participou dos primeiros momentos de fundação da Oposição de Esquerda no Brasil, sempre se assumindo como uma simpatizante do trotskismo. Ela também foi militante e fundadora do Partido dos Trabalhadores, tendo assinado a ata de fundação do partido. Foi uma personalidade presente em diversos momentos da vida política brasileira, como nas Diretas Já.


Seus sonhos de ser atriz foram adiados pela crise financeira da família, quando ela arrumou emprego num banco. “Meu pai não queria, mas não podia impedir”, recorda. Na época, já usava cabelos curtos e usava saias na altura do joelho. Com conhecimento de mercado financeiro e juros, fazia os cálculos das aplicações de 400 clientes por dia. De lá, transferiu-se para uma fábrica, onde era responsável pelos salários dos funcionários. “Vocês estão sendo explorados”, disse, certo dia, aos colegas do trabalho. Algumas horas depois, estava desempregada. “Fui delatada por uma pessoa que ouviu a conversa”, conta. Era um sinal das causas da esquerda que abraçou a vida inteira.


No início de 1941, ela se questionava sobre o que o futuro lhe reservaria. A preocupação tinha sua razão. Lélia Abramo descobriu aos 30 que tinha um problema sério de saúde, pois sentia fortes dores na cabeça e sofria com febres freqüentes. Consultou dezenas de médicos no Brasil, mas nenhum soube diagnosticar a doença. Cinco anos mais tarde, sua irmã Beatriz casou-se com um oficial do exército italiano, que foi chamado para voltar à terra natal. Lélia pegou carona e foi para a Itália cuidar da saúde. Foi atendida por um médico que descobriu as causas de seu problema: cistos no ovário esquerdo. A cirurgia para a retirada do órgão afetado foi marcada, mas um outro cirurgião a operou. Ao acordar, ela descobriu que o médico havia retirado o ovário saudável e que nunca mais poderia ter filhos. “Foi um choque”, diz. “Abdiquei do casamento a partir daí. Eu queria uma porção de filhos”, lembra.


Mesmo depois do tratamento, Lélia não voltou ao Brasil. A Segunda Guerra Mundial estava em pleno fervor na Europa e ela teve que ficar. Sem dinheiro e com a saúde debilitada, perambulava pelas ruas de Roma, na Itália, atrás de alimentos. Testemunhou o racionamento imposto pelo governo em função dos conflitos.


Em 1950, com o fim da Grande Guerra, Lélia pôde enfim voltar ao Brasil, após 12 anos. Foi época da eleição de Getúlio Vargas à presidência da República. “Eu me sentia uma estranha dentro de meu próprio país”, recorda a atriz. Durante um tempo, trabalhou como jornalista da agência de notícias Ansa, sob o comando do jornalista Giannino Carta. Ao mesmo tempo, atuava em grupos de teatro amador voltados à colônia italiana. Em 1958, com 47 anos, foi convidada para participar da primeira montagem de "Eles não Usam Black-tie", uma peça de Gianfrancesco Guarnieri. Ganhou o papel de Romana, personagem que morava num morro do Rio de Janeiro. “Todos achavam que eu seria um fracasso por causa de meu forte sotaque italiano”, recorda a atriz. No dia da estréia, foi aplaudida de pé pelo público do Teatro de Arena, no centro da cidade. E, no mesmo ano, abocanhou o prêmio da Associação dos Críticos Teatrais de São Paulo e o Prêmio Saci, como melhor atriz coadjuvante. “Foi aí que surgiu meu primeiro convite para a tevê”, diz Lélia.


No final da década de 60, a tevê brasileira começava as transmissões de programas ao vivo. Os atores ensaiavam os textos por até oito horas para evitar gafes no ar. Sua primeira novela foi "A Muralha", transmitida dos estúdios da TV Cultura, em São Paulo, às terças e sextas-feiras. No cinema, estreou em "Vereda da Salvação", de Anselmo Duarte, em 1964. No mesmo ano, foi convidada para participar da inauguração de uma nova emissora carioca: a TV Globo. “Todos os artistas correram para lá”, lembra. Treze anos mais tarde, a emissora seria a responsável por sua maior decepção. Eleita presidente do Sindicato dos Artistas de São Paulo, Lélia queria melhores condições de trabalho para a categoria. De uma hora para outra, sua personagem na novela "Pai Herói" morreu. “Daí em diante, fiquei esquecida”, diz. “Acabaram com meu direito de trabalhar.” No ostracismo profissional, abraçou a luta sindical.


Participou de 27 telenovelas, 14 filmes e 23 peças de teatro, tendo convivido com grandes nomes do teatro paulista, como Gianni Ratto e Gianfrancesco Guarnieri. Recebeu os mais importantes prêmios do País como melhor atriz e seu último trabalho no teatro foi em "A Mãe de Brecht" em 1985. Na televisão depois de ser "esquecida" pela Rede Globo foi para a TV Manchete onde fez "Mania de Querer" e uma pequena participação em "A História de Ana Raio e Zé Trovão".


A editora da Fundação Perseu Abramo lançou sua autobiografia em 1997, intitulada "Vida e Arte - Memórias de Lelia Abramo".


Antonio Candido descreve Lélia Abramo como uma atriz que "nunca vergou a espinha, nunca sacrificou a consciência à conveniência e desde muito jovem se opôs à injustiça da sociedade. Que sempre rejeitou as vias sinuosas e preferiu perder empregos, arriscar a segurança, sofrer discriminações para poder dizer a verdade e agir com seus pontos de vista..." (prefácio Vida e Arte)



Fontes: Matéria Istoé Gente, Site Mulheres do Cinema Brasileiro, Wikipedia, Arquivo Rodolfo Bonventti, Cinemateca, Folha online e Terra.


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Novela "Uma Rosa Com Amor":

http://inmemorian.multiply.com/video/item/174

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