segunda-feira, 27 de julho de 2009

Entrevista concedida por Sérgio Viotti em 2007

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O Jornal Modus Vitae, em Maio de 2007, conversa com Sérgio Viotti, quando ele interpretou um personagem da peça “O dia em que raptaram o Papa”. Viotti foi “Alberto IV”, um papa que imaginou ser por algumas horas, um transeunte comum pelas ruas de Nova York, mas o taxista que o levaria para a aventura - anônimo, judeu, o reconheceu prontamente e o seqüestrou.

O desenrolar da peça teatral de grande sucesso, é uma comédia, e Sérgio Viotti é mais que um ator, ele é mesmo o Papa. Procuramos essa “santidade” do teatro nacional, próximo aos seus 80 anos, e descobrimos que o “Papa” é mesmo pop.

Foi mais ou menos assim que abro a entrevista com Viotti, no entanto, é preciso dizer aqui, que eu me emocionei demais com a peça. Na verdade, muita gente se emocionou. Há momentos de total silêncio do público, e respeito, tamanha figura que ele travestido de PAPA representou.

Assisti a peça, no dia da estréia, algumas pessoas foram entrevistadas na saída ainda tomadas pela emoção. A TV Gazeta vem em minha direção, que não conseguia parar de chorar, para saber exatamente o que eu estava sentindo. Foi difícil de conter e explicar o que eu acabara de viver. Enquanto isso, outros repórteres pegavam outras pessoas para entrevistar, e também o Sérgio que mal conseguia sair do lugar, depois de um belo banho e pronto para comemorar a noite de sucesso, porque as mulheres, algumas, chegavam perto dele, e beijavam sua mão, como se ele fosse mesmo o PAPA!

Ele muito delicado ria um pouco constrangido... Deixava rolar, nem dava tempo de explicar, ou argumentar absolutamente nada! Até que uma senhora se ajoelha e pede para beijar suas mãos! Dorival que sempre cuidou dele com enorme carinho, se divertia e desta vez, pediu “por favor”, para que a senhorinha não se ajoelhasse!. Aí era demais!

E continuo eu...
O relógio disciplinador de encontros formais apontava acanhado que já se passava da meia noite. Constrangimento lógico dessa invenção denunciadora de horários, pois, o apartamento é de Sérgio Viotti e de Dorival Carper, e se existe lugar no mundo em que horário não é bem visto é neste cantinho mágico, onde poesia, música, champagne ( Tatinger é a preferência de Carper ), vinhos ( tintos de Nuits St Georges, a predileção de Viotti), aliado ao menu degustation do Chef Carper, sublimam a vida, e não apenas um espaço de tempo. É claro que a entrevista aconteceu já na madrugada, sob a vigia de quadros, esculturas livros, objetos, onde tudo faz sentido, nada é por acaso, cedendo a impressão de estarmos no meio de uma história, e a medida que nos envolvemos mais com aquela atmosfera quase lúdica, percebemos que estamos participando mesmo de uma grande história, de amor, entre Viotti, Carper, “Modus Vitae”e a vida.

Vou deixar aqui, todas as perguntas que fiz a ele, sem obedecer a ordem original da entrevista. Vocês poderão perceber um pouco desta cabeça recheada de cultura e de conhecimento.

A maior qualidade de Sergio Viotti?
“A minha fidelidade em todos os sentidos”

Fala a sua idade?
“Claro, 79. É um milagre! “

Um filme que mexe com Você.
“Sou saudosista e adoro “E o Vento Levou”. Tenho a fita e amo. Conheci Vivian Leight, linda, mas chatérrima!!!"

Um país. “A Inglaterra” ( Sérgio morou por lá muitos anos de sua vida, foram mais de 14).

O que te dá mais prazer de fazer?
“ Escrever. Foi o que sempre mais gostei de fazer. Lembro-me de uma vez, eu tinha 16 anos, e estava na casa de meu avô Manoel Viotti. Ele tinha uma máquina de escrever “Royal” e não deixava ninguém perturbá-lo enquanto datilografava, porém, minha companhia não lhe importunava. Eu ficava encantado no maior silêncio, e num belo dia ele me disse: “quer aprender a datilografar?”. Respondi mais que depressa que sim! Ele então me ensinou, e muito mineiramente me usava para bater os verbetes do seu dicionário. Vovô foi quem escreveu o primeiro dicionário de gíria brasileira. Eu achava aquilo uma Glória, pois estava colaborando com vovô, isso era mesmo o máximo! “


Você tem irmãos?
"Sou filho único e não sei se feliz ou infelizmente. Eu detestaria ter um irmão burro; iria ignorá-lo! Tenho horror à estupidez humana, `a burrice. Tenho alguns parentes que eu não posso nem ver, quanto mais ter um irmão, ou irmã desse tipo crescendo ao meu lado, que eu teria que agüentar a vida inteira. Deus me livre!"


Timedez é coisa comum entre os atores, você concorda?

“É verdade. Essas pessoas que se dedicam a essa coisa do representar, do ser artista, essas pessoas são mais tímidas, umas das raízes que faz com que você seja ator é de fato a de você poder se despir de você mesmo."

É preciso ter coragem para interpretar?

“Não, não! É uma coisa que você sabe fazer. Você vai, - e faz! Certa vez perguntaram ao Anthony Hoppinks, que eu acho um ator espantoso, como é que ele criava um papel. E com aquela cara bem descofiada ele disse: “Eu sou um ator! Dão um papel, eu leio, eu faço! “ É apenas isso. Essa gente fala as coisas de maneira simples, com enorme clareza, e que todos entendem."

Explique sua paixão por Shakespeare?

“Posso explicar com cinco palavras?"

"Porque ele é muito bom! Não tem outra explicação. Sempre digo que tudo que não está na Bíblia está em Shakespeare, e tudo que está em Shakespeare está na Bíblia.”

A cidade que mais gosta?
"Londres."
Entre Rio e Sampa?
"São Paulo!"

Uma mulher?
"Dulcina. Ela é a síntese. É mulher, professora, foi freira no palco, prostituta.”

Um homem..
“Jesus Cristo”

Um sonho
"Não tenho, nunca tenho, é uma coisa abstrata demais."

O que menos gosta em você?
“A minha preguiça “

Um prato predileto
“Uma macarronada a bolonhesa – comeria todos os dias”

Música
“The way you look tonight”

Dos livro todos que você tem, qual especial?
"Todos! Não dou e nem empresto nenhum deles."

Você nos disse que não fez nenhum curso de interpretação. Como pode? E como você vê isso nos dias de hoje?

“Para ser um artista antes de tudo tem que ter uma coisa que se chama talento! Se você não tem, não insista. E talento é uma coisa que Deus dá. É inexplicável."

Entre Rádio e TV, qual você escolhe?

“Talvez eu goste um pouco mais de rádio. Sabe por quê? Em televisão quando sai alguma coisa errada a culpe é sempre sua. No rádio funciona diferente. Agora veja bem, meu envolvimento com o rádio foi inesperado, não foi planejado. Não fui fazer rádio na Europa. Eu fui à Europa! E a maneira de ir ao Velho Mundo era fazer rádio lá. Outro fator determinante se deu em razão do meu ingresso na BBC que não era uma rádio comercial e sim cultural, isso me ajudou bastante. A BBC ensinou-me mais que fazer rádio, me descortinou para a vida artística."

Sérgio,você foi filho único e optou por não ter filhos, por qual razão?

“Penso que se tivesse um filho nunca mais dormiria. Sou uma pessoa obcecada com várias coisas, uma delas é exatidão, outra é perfeição, outra é integridade, enfim, se meu filho ou minha filha não correspondesse exatamente a tudo aquilo que eu exigisse, ou eu me suicidaria, ou nuca mais dormiria. Esse é o tipo de temperamento de um Viotti. Isto é um segredo dos Viotti. Tenho uma prima que falo com ela todos os dias da nossa vida e nos divertimos muito. Pensamos exatamente igual. Às vezes ela diz assim: “Hoje estou tendo uma das minhas Viotadas”. E eu sei exatamente o que ela está dizendo."

O que é Dorival Carper para você?
( neste instante, ele respira fundo, pensa, e com sua voz macia e calma faz chorar o meu marido, e nossos amigos em comum, Antonio Carlos Nascimento e Carolina Nascimento)

“Dorival é meu amigo, meu irmão, meu pai, meu conselheiro, meu colega, meu produtor. E isso há 44 anos ( Pausa). Eu não seria exatamente a pessoa que sou hoje, se não fosse ele. Sempre me ajudou, enormemente em todos os momentos da minha vida. ( Sérgio aponta Dorival que também acompanha a entrevista) sempre me deu um grande apoio. Quando tive problemas grandes como a doença de meu pai, doença de minha mãe. Nós somos mais que amigos e irmãos. No fundo no fundo, somos uma pessoa só! Nos ajudamos e nos respeitamos um ao outro de uma tal maneira, que eu acho um privilégio ter encontrada na vida uma pessoa como Dorival."

Sua veia artística vem da sua mãe?
“Não. Não. O amor pela arte, pela música, a paixão pelos livros e a pintura, herdei dos Viotti ( família do pai). Minha falação sim é dos Silveira...falam demais. Você tem que implorar de joelhos para um Silveira ficar quieto. Todos os Viottis que eu conheci e conheço tem um lado artístico marcante; não necessariamente sendo um profissional."

A sua crítica sobre a peça “O Balcão “ é maravilhosa e é considerada uma obra de arte. Dizem que ela supera a peça! Como é isso?

“Isso foi em 1971. Fui convidado para fazer a peça, mas como tenho medo de altura acabei recusando. Esta obra do escritor e dramaturgo Frances Jean Genet ( 1910 – 1986) contava com cenografia consubstanciada de um espiral de ferro vertical, uma espécie de elevador representando um palco de acrílico , que subia e descia. Foi um dos espetáculos mais extraordinários que eu vi em toda a minha vida. Não fiz a peça, mas fiz a crítica."


E assim, foi concedida a entrevista para mim, ao lado de meu marido e um casal de amigos, com a maior tranquilidade. Vez por outra davamos uma gargalhada, tomavamos mais um vinho, e saímos de lá, muito tarde. Os dois nos receberam com a maior classe! Assim, normalmente, como eles sempre são. Um encanto! Um presente.

Fonte: Blog Conceição Duarte

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